domingo, abril 24, 2005

Edgar mete aí o «Bella Ciao»

Quando faço alguma coisa sem pretexto olham para mim. Quando faço alguma coisa com pretexto não olham. Agora vou festejar a liberdade e ninguém vai olhar para mim. Eu sou sempre muito egoísta a festejar a liberdade. Distraídamente pensa-se que estou a fazer outra coisa qualquer que não aquela que realmente estou. Nunca conheci nada que não fosse horizonte e tempo intermédio. O Sul estará muito presente? Já esteve menos. E depois da liberdade? Não há depois.

Controlo

De vez em quando tomado por acessos de consciência densa e puritana pergunto-me (isto é maneira de escrever porque eu nunca me pergunto, só me respondo) se terei uma experiência realmente frutífera que me permita andar a dizer coisas (poucas ultimamente) num blogue. Escrever requer uma certa ponderação, pouca que seja. Faça um blogue em cinco minutos. Faça agora, «pague» depois. Take it easy escrever um post é como actividade sexual com retenção de natalidade. Prazer no acto. Inconsequente na descendência. Repetir.

segunda-feira, abril 18, 2005

Filosofia de alcova

- A tua sorte é seres bom.
- O teu azar é seres boa.

Acasos felizes.

José Gil

Os sucessos literários estão logo do lado esquerdo na primeira mesa de quem desce as escadas rolantes. São as parvoíces do costume, mas cada um é como cada qual, uma frase sem outro propósito que não seja amesquinhar a glória e defender os menores. Portugal, Hoje: O Medo de Existir, o décimo sexto livro de José Gil que até aqui eu não conhecia de lado nenhum, transformou-se num sucesso editorial. Um pequeno tratado de Filosofia com novos conceitos pensados pelo autor, polvilhado de Psicanálise e Sociologia e arguta perspicácia na avaliação da coisa habitual que na maioria das vezes é significante mas que por cá se esgota na normalidade, sem outro tempo que não seja o da repetição. A cultura televisiva que num país de incultura sobressai como molde, a inconsequência do acto seja ele uma ida ao cinema ou a realização de uma ilegalidade: tudo inscrito em sitio nenhum ajudado pela ausência de memória e de um torpor nebulado. A inexistência de um verdadeiro espaço de diálogo onde a primazia seja dada ao confronto, troca e partilha. Uma suficiência regrada que coloca o coração aberto numa perpétua dúvida e hesitação, a diminuição da «potência de vida» pela obliteração do desejo, não sabendo que um primeiro desejo se prolonga num segundo; a urgência bipolar entre o Salazarismo e uma espécie de «pós-modernidade» irreal e pior que tudo não-preparada. A cultura do medo, o sistema de inveja e o ressentimento que contaminam as relações sociais. Sobre tudo isto, que são só alguns exemplos que destaco, discorre a intuição do génio observador. O sucesso do livro explica-se pela identificação com a experiência empírica do leitor. Ali são descritos os colegas de trabalho, as chefias, os amigos, a família, os vizinhos, a ex-namorada, ali vive sobretudo a dificuldade de um povo de escala reduzida com medo de viver. O Super-Ego Salazar é uma repressão vezes dois no nosso inconsciente colectivo.

... és mesmo tu

Na penumbra, a dormir e olhadas de perto todas as mulheres são iguais. Pode ser A, B, ou C que é igual ao litro. Mas basta abrirem os olhos, isto é, acordar, para tomarem rosto e personalidade. Sou mau vizinho de leito. Acordo durante a noite para me certificar com quem estou a dormir. É que a inacção deixa-me confuso e é um perigo porque não se distingue.

quarta-feira, abril 13, 2005

Do vidro e da carne

O que eu dava para ter como amigos certos escritores preferidos. Um escritor predilecto daria na maioria das vezes um bom amigo. Já escritoras parece-me uma incógnita. Continuo ainda a falar dos melhores. Quando Sylvia Plath escreve a Câmpanula de Vidro (um excelente livro) não dá muita vontade de ter privado com ela. Significa que geralmente as boas escritoras só servem para se ler, uma vez que sob o ponto de vista social, ou mesmo sexual - é aqui que eu também quero chegar - não devem ser muito estimulantes. Pelo contrário, dentro e fora das páginas as mulheres sabem o que um bom intelectual vale. Trata-se de uma nota de rodapé de género e evolução. Se eu fosse uma rapariga boa-todos-os-dias queria lá saber do registo laborioso das minhas alterações no sistema nervoso: uma conclusão igualmente verdadeira e retrogada. Uma boa cabeça não invalida um generoso decote. Potencia-o. É isto que deve ser difundido para agrado geral. Por enquanto são só os Gabrieis Garcia Marques que escrevem coisas vivas como Memórias das Minhas Putas Tristes. Mas dei dois maus exemplos. A Sylvia Plath era feminista. O Gabriel Garcia Marques é sul-americano. Nada estará mais nos antípodas.

Secas

Na melhor discoteca de lisboa - e o problema é ser de longe a única e a melhor - forma-se fila de espera à entrada. Passa-se que chuvisca. Como só tenho duas mãos não gosto de inutilizar uma com guarda-chuva se a água molha pouco e o percurso é curto. Estando bem acompanhado isto muda de figura e ofereço-me para segurar no bem lembrado guarda-chuva. Se além do mais me pedem expressamente a utilização do patético e utilissímo objecto recusando pinga de água a demolhar corpinho já de si fresquinho sem necessidade de auxílio atmosférico, há que ter a decência de ir ao porta-bagagem e cumprir telhado artificial. Sai-se do carro, calcorreia-se, fim da fila, início, entrada, dever cumprido, cabelo seco, chapéu molhado, oiço referência do porteiro demasiado simpática para sê-lo mesmo sobre ter estado na fila com o chapéu aberto. Em que é que estar de guarda-chuva aberto belisca a imagem de um espaço nocturno, ainda que seja o melhor? Porque é que tenho de interiorizar regras que nem no bom senso existem? Porque é que não consigo remeter para o caralho quando essa é a forma de tratamento mais educada a dado momento?

Portugal é um país fraquinho que na falta de conteúdo ou mesmo na sua presença continua a privilegiar tão desesperançadamente - necessidade apenas declarativa, ela própria vazia de força - uma insegura aparência externa pormenorizando a irrelevância até à interiorização de características de doente mental a pessoas aparentemente normais. Em Portugal o pessoal sabe melhor o que é a normalidade do que a saúde. E não estou a falar de constipações.

sexta-feira, abril 08, 2005

Ainda vontade de subcultura


Natasha Bedingfield

Mas isto não é agricultura biológica.

A religião?

God Only Knows

You may say I am cynical, but I say man is flawed
He has a vague memory of before some fall
Behaving like a reptile, but talks of walking tall
If god is in his image, the almighty must be small
God only knows

Swaggart has been caught with his trousers round his knees
After damning me and you to hell for eternity
Sex and power and money is the prayer of these priests
They bribe their way past heaven's gates and steal a set of keys
God only knows

My guru has been sleeping with adepts and with sheep
While I was fucking celibate, self-righteous in belief
Yesterday he was God, now he is a creep
We fell upon each other starving for relief
God only knows

I damn you all to hell

I speak in the name of god
I know him intimately
I speak in the name of that white haired old man in the clouds
Always a man
Dispensing lightening justice from his fingertips
Watching you, every second of the day
Just waiting for you to fuck up
As self-righteous and bigoted as those who created him
A cruel desert god with absolutely no sense of humor

I speak in the name of God
I'm his intermediary
I'm a monk, I'm a priest, I'm a vicar
If you want to go to God, you have to come through me
Because my God is bigger than your God,
My God is bigger than your God
My God is the only way

How do you feel old man?
How do you feel?
Being spoken for by these self-righteous fanatics

Oh Lord,
Is heaven full of loath, of these babbling preachers and God-fearing biggots
All this self-righteous self-appointed prophets

Because if so,
Well, I know where I'd rather be
Away from this cacophony

God only knows
God only knows
God only knows

Tema de James do Album «Gold Mother»

terça-feira, abril 05, 2005

Ou talvez tenha

Há pessoas que vão ao cinema e querem de algo modo que aquilo mexa com elas. É legítimo e até muito acertado. De modo que se forem muito exigentes vão ver filmes de terror. Quanto mais exigente for a pessoa mais difícil é estimulá-la. Ele há gente que finge. Ele há gente que cumpre rotina. Estes não vão ver filmes de terror. Estes saem do cinema flácidos. Prefiro a razão primitiva ao salto no vazio. No fundo os intelectuais são todos uns frouxos. Uns esporra fácil.

Vontade de subcultura

Há vários dias que me anda na cabeça um título para um post. O título é o que meti aqui em cima. No habitual amarelo sobre azul. Isto é uma novidade porque geralmente a ideia para o título vem sempre depois do post estar escrito. Além disso a ideia para nomear um post pode não ser tarefa fácil, e isto mais por dificuldade assumida de colocar de acordo o texto com o indício que o antecede do que por boa ou má imaginação. É que o título pode não estar directamente relacionado com o texto. O ponto toca no seguinte: eu tenho o título para o post mas não tenho o post.

segunda-feira, abril 04, 2005

Chama-me

Certa pessoa de andar elegante e olhar desinteressado propõe-me um adjectivo também ele o mesmo: leviano. Percebo a intenção e não me desagrada o mimo. Há muito poucas coisas que significam algo de mau. Na tradução dela, isto é, da pessoa, reparo que não há sentido pejorativo na dedicatória; que daqui a tempo saberá ela ajustar de melhor maneira o significado aos actos. De todo o modo uma provocação nunca deixa de manifestar um pedido.

Desconsiderar

Aqui mora a diferença: não é subtileza que essa acaba por ser descoberta. É uma carga de trabalhos. Não dá para ter consideração por mim. Impossível pegar na formalidade exterior e andar a fazer exercicios de aplicação todos os dias em moi-même. Despropositado viver saudavel com cuidados paliativos. É por isso que não conheço aquelas pequenas chateações do dia-a-dia. Desconsiderar as minudências e entretê-las na sua irrelevância. Depois não dá para ter desigual tratamento com o outro. Devo desconsiderá-lo na medida do possivel. Ca está, isto já soa hostil a quem se considere muito. Eu gosto de rir um bocado.

sexta-feira, abril 01, 2005

Reflexões de um desanimado

É incrível o número de relações que se mantêm anos em estado quase comatoso. É a chamada inércia: as famílias já se conhecem, eles já conhecem mais ou menos os defeitos um do outro, “antes este que pior”, estar sozinho é impensável, já há amigos comuns, especialmente outros casais, se tudo acabasse como seria? É melhor deixar-me andar, não fazer ondas, “um dia destes casamo-nos e...”
E depois surgem as traições... Então em viagem de finalistas é um fartote... Parece uma espécie de sindroma de fim de ciclo. Ter de experimentar antes do... fim do ciclo. Realmente não parece muito saudável namorar 5 ou 6 anos. Parece que já se esteve casado... Namoros longos nunca acabam muito bem mas uns acabam melhores do que outros. As “relações” parecem hoje em dia cada vez mais frágeis. Parecem copos de cristal, sendo que, às vezes, a qualidade do cristal não é grande coisa... Ok, estou um bocado amargo (ou realista), é certo que há relações que funcionam bem, é certo que há amor e afecto. Mas também vejo muita solidão carência e mesmo conveniência...
Mas continuo a acreditar. Parece uma questão de fé.