quinta-feira, dezembro 09, 2004

Pequena declaração de intenções

O amor perante a contrariedade tem a tendência para se amesquinhar. Há qualquer coisa de mendicante que acaba por vir à superfície. Parece que é o sentimento negativo que fica. Chorar baixinho. Fuga de si mesmo. Vida gatuna. O silêncio abate-se. Confrontado com a desfaçatez o amor insignifica-se. Em vez de estrubuchar. Parece-me bastante legítimo o amor fazer a vida negra àquela indiferença que delapida a alma. Alimentar pela chama forte o caldeirão da paixão. Não existe nenhuma morte física. Não tem que sobrevir de imediato o luto. Transformar o sentimento mais vivo numa ausência de esperança significa desde logo relacioná-lo com o falso. Fazer do amor uma ave de rapina é também uma maneira de diferenciar o nosso de outros «amores». Não raro o amor fica orfão, jogado na rua a um canto. Só sobra a pena. O amor é ou não é o sentimento mais absoluto? Deve por isso pedir desculpa quando esta se impõe. Não tem que pedir mais nada. O pedido de perdão já é um acto nobre o suficiente. Um dia relativiza-se tudo e já nada tem importância. É uma lástima que o amor se entregue apenas às lágrimas numa passividade vegetativa. O sofrimento não serve para ultrapassar e regredir, implica crescimento e pode estabelecer algumas adaptações. Mas o amor unilateral fica com os planos todos baralhados, passa demasiado tempo de joelhos e mãos postas. No século XIX matava-se por amor, agora mata-se o amor. Claro que depois da sua luta particular o amor cala-se. Há sempre outro alguém que vale a pena. Juro que há.

3 Comments:

Blogger Mar said...

Belíssima declaração de intenção. Sortudo o objecto desse amor que, embora unilateral, não desiste...até que suja o outro. Que o há, também concordo! ;-)

12/11/2004 10:59:00 da tarde  
Blogger jp(JoanaPestana) said...

O amor não se mata vai esmorecendo devagar, quiça já substituido, mais não seja sonho que nos alimenta o ego vegetativo...
Chorar é mera função , como defecar ou urinar. Alivia e areja-nos os canais lacrimais.
É diferente da paixão.
Há criaturas que já nascem apaixonadas, no choro,na rebeldia, no agarro, na limpidez com que nos embalam, na pele que nos alvoraça, no cheiro que nos deixam na almofada.
Recordam-nos que a vida é feita de nascer de sois emancipados.
E ninguem discorda, que há sempre outro alguém que valha a pena.
Nem precisa de jurar, a malta tambem já o encontrou. :-)

12/17/2004 12:18:00 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Enjoyed a lot! »

3/05/2007 09:44:00 da tarde  

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